O autismo, um espectro no qual encontramos diversos graus que variam entre leve, moderado e grave. Mas, para nós, existem tantos autismos quanto autistas há. É preciso considerar que os autistas têm dificuldades importantes em lidarem com o mundo, seja no sentido amplo ou estrito, e que suas famílias estão completamente envolvidas nestas dificuldades, sobretudo em lidarem com esta criança que se apresenta tão distante de suas expectativas e ideais.
Alguns sinais precoces do autismo são praticamente consenso entre todos nós e são constantes tanto em autistas conhecidos como kannerianos, quanto nos Aspergers: a ausência do olhar e a falta de atenção conjunta (uma criança pode indicar com o dedo um objeto que não está olhando), e a resistência radical em ceder a voz e os excrementos que, juntamente com os alimentos, não são colocados na relação demanda/desejo na interação com quem deles cuidam .
A psicanálise propõe uma forma de compreender o funcionamento autístico, tanto afetivamente quanto cognitivamente. Compreender um pouco o funcionamento, em alguns casos, possibilita um apaziguamento e pode ajudá-los em uma mudança subjetiva. Somente com uma mudança efetiva na subjetividade acreditamos ser possível um avanço cognitivo real, pois os métodos de aprendizagem se detêm em limites traçados pelo ideal social e pelas expectativas a serem correspondidas ou não por quem está submetido a estes.
O psicanalista, em sua tarefa, se coloca à escuta para recolher os sinais que os autistas emitem em suas tentativas de se comunicarem e, assim, buscarem aliviar um pouco a angústia que os invade. Para a psicanálise, o autista é um sujeito sempre a surpreender com um saber próprio (pois o saber sobre ele está nele!), não sendo um indivíduo a ser treinado, sem qualquer subjetividade.
Quando falamos de Batalha do Autismo nos colocamos em um diálogo entre saberes tocados pela mesma causa: o autismo – sua origem e seus tratamentos, buscando transmitir que a psicanálise não é uma ciência baseada em evidências, mas um saber sobre a subjetividade humana. Falamos também que a psicanálise pode contribuir para o tratamento de autistas, de uma forma própria, que ela pode compor o leque de possibilidades terapêuticas juntamente
com inúmeras outras.
A psicanálise de Orientação Lacaniana tem trabalhado com a hipótese do autismo como uma estrutura psíquica. Uma quarta estrutura. Isto quer dizer explicitamente que, para nós, o autismo não é uma doença ou uma deficiência, mas uma forma de estar no mundo, assim como as demais estruturas clínicas, a saber, psicose, perversão e neurose. A psicanálise recusa a ideia de normalidade e considera o homem normal “uma ficção estatística”. Se não é uma doença, não temos que buscar uma cura, mas um tratamento, ou vários. Tratar não é o mesmo que curar. Curar é buscar eliminar uma doença. Tratar é oferecer melhores condições de vida, mesmo subjetiva .
Os autistas podem chegar a ser independentes como resultado de tudo o que desenvolvem, cada um, ao seu modo, a partir do que lhes é oferecido e do que decidem apreender. Um autista pode desenvolver seu modo de viver e de compreender a vida, pode aprender sobre os sentimentos, sobre as variações dos sentidos das palavras, podem desenvolver habilidades específicas impossíveis a qualquer um de nós, mas sempre através de um método, de um ‘sistema’ estritamente construído para obter os mesmos resultados frente às mesmas situações.”
Fragmentos retirados do texto:
Título: A psicanálise pode contribuir para o tratamento de autistas.
Autora: Bartyra Ribeiro de Castro.